A recente declaração de Estado de Emergência em Saúde Pública no município de Colíder, através do Decreto nº 038/2025, devido à epidemia de arboviroses urbanas (dengue, zika e chikungunya), levanta uma série de questionamentos sobre a priorização dos recursos públicos.
A decisão, embora compreensível diante do cenário epidemiológico, torna-se paradoxal quando confrontada com a tramitação do Projeto de Lei nº 022/2025 em Regime de URGÊNCIA, que visa reconhecer o interesse público da "Feira Técnica e Exposição Agropecuária de Colíder – EXPOLIDER" e autorizar o Poder Executivo Municipal a investir na contratação de shows artísticos como fomento à iniciativa privada, além de autorizar a abertura de crédito suplementar no valor de R$ 2.600.000,00 (dois milhões e seiscentos mil reais).
A lógica da emergência exige a concentração de esforços e recursos no combate à crise sanitária. Nesse contexto, a destinação de verbas da Lei Orçamentária Anual (LOA) para a realização de festividades, em vez de priorizar ações de saúde pública, configura uma clara contradição.
A situação se agrava quando não expõe a possibilidade de buscar alternativas de financiamento, como emendas parlamentares ou recursos da Secretaria Estadual de Cultura, Esportes e Lazer (SECEL), que poderiam aliviar a pressão sobre o orçamento municipal e garantir a continuidade dos serviços essenciais.
A Lei nº 14.133/2021, em seu artigo 72, prevê a possibilidade de dispensa de licitação em situações de emergência ou calamidade pública, desde que comprovada a urgência e a necessidade da contratação. No entanto, a mesma lei exige que a administração pública observe os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, o que implica em avaliar se a medida adotada é adequada, necessária e proporcional ao objetivo a ser alcançado.
A questão central não está na importância histórica e econômica da EXPOLIDER, mas sim na fonte do financiamento para sua realização.
Nesse sentido, a destinação de recursos da LOA para a realização de shows em uma feira agropecuária particular, em detrimento do combate à epidemia de arboviroses, parece ferir o princípio da razoabilidade. A medida não se mostra adequada nem proporcional à gravidade da situação de emergência, além de levantar dúvidas sobre o interesse público da contratação.
A Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº 101/2000), em seu artigo 1º, estabelece que a responsabilidade na gestão fiscal pressupõe a ação planejada e transparente, em que se previnem riscos e corrigem desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas, mediante o cumprimento de metas de resultados entre receitas e despesas.
A destinação de recursos da LOA para a realização de shows, em detrimento do combate à crise sanitária, pode ser considerada um desvio de finalidade, uma vez que compromete a capacidade do município de cumprir suas obrigações prioritárias. Além disso, a falta de transparência na gestão desses recursos e a tramitação do Projeto de Lei nº 022/2025 podem gerar questionamentos sobre a legalidade da medida, especialmente no que tange à abertura de crédito suplementar em um contexto de emergência em saúde pública.
A questão central não está na importância histórica e econômica da EXPOLIDER, mas sim na fonte do financiamento para sua realização. É inegável que eventos desse porte geram benefícios para o setor agropecuário e movimentam a economia local. Contudo, tais benefícios não podem se sobrepor ao dever fundamental do Estado de garantir o bem-estar da população, especialmente quando a própria administração municipal reconhece a necessidade de medidas emergenciais na área da saúde quando edita um Decreto de emergência.
Diante do exposto, é fundamental que a administração pública reveja suas prioridades e busque alternativas de financiamento que não comprometam o combate à crise sanitária. A transparência na gestão dos recursos públicos e o respeito aos princípios da legalidade, da razoabilidade e da responsabilidade fiscal são imprescindíveis para garantir a efetividade das ações de saúde pública e a confiança da população.
*Rafael Pio é assessor parlamentar, sociólogo, bacharelando em Ciência Política e membro da ABCP – Associação Brasileira de Ciência Política.
*Os artigos são de responsabilidade seus autores e não representam a opinião do Mídia Hoje.
Nossas notícias em primeira mão para você! Link do grupo MIDIA HOJE: WHATSAPP
Siga a pagina MÍDIA HOJE no facebook: (CLIQUE AQUI)